sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Pequeno tratado sobre a morte

Eu não tenho medo de morrer. Não que eu vá aceitar muito bem o fato se eu morrer agora (espero morrer bem velhinha, cansada de tanto viver, de preferência entrando em auto-combustão), mas o ponto é que, apesar de minha mãe dizer que morrer dói e que não é só fechar o olho e dar o ultimo suspiro não senhor, eu prefiro a versão do cinema: o que dói é ser torturado, passar meeeses sofrendo de uma doença grave, etc. Assim, como tenho planos (e rezo todo dia pedindo) para que minha morte seja rápida e indolor, eu me preocupo mais com o arrumar das malas do que com a viagem em si.

Quando eu morrer, quero ser enterrada com um canivete na altura da minha mão. No outro lado, uma máscara anti-poeira. A lanterna pode ser daquelas que coloca na cabeça e eu já posso ir com ela, que polpa esforços e economiza tempo, já que eu vou precisar das minhas duas mãos pra sair dali (ainda que para partir a madeira do caixão, eu só vá precisar de uma).

Durante o velório, por favor, nada daquelas coroas de flores. Gente, sério. Aquilo é MUITO feio e eu, pessoa de bom gosto e antenada às novas tendências, vou me sentir muito bem partindo desta para uma incrivelmente melhor, se nesta daqui tiver aquelas coroas. E vocês querem que eu sinta saudade de vocês, certo?

Nos momentos finais, eu agradeceria se tocassem Time of your life, do Greenday, ou Blackbird dos Beatles. Na verdade, eu ficaria feliz se tocassem as duas, mas não seguidas, cada uma em sua hora, pra ter a comoção e as pessoas gravarem a música e lembrarem de mim sempre que as ouvirem. Se toca tudo junto, não tem o feeling.

Ah, outra coisa, quando o choque inicial tiver passado e vocês já tiverem chegado naquele ponto do velório em que já estão rindo e super se divertindo em segredo, por favor, façam isso perto de mim! Sério, é o MEU velório, vocês acham que eu ficaria feliz com grupinhos de pessoas cochichando e rindo sem que EU estivesse participando?

Se alguém tiver sofrendo, chorando, se descabelando, façam o favor e fiquem exatamente onde estiverem. Deixem a pessoa sofrer. Quando ela estiver mais calma, vão lá e dêem um abraço. Fim. O primeiro que eu ouvir dizendo 1)“não chora que agora ela tá num lugar melhor” ou 2) “que pena, né? Logo agora que ela tava pensando em pintar as paredes da casa de lilás fluorescente...” eu volto e dou um sustão ali mesmo. “E aí, pra quem você acha que ela deixou as jóias?” tá liberado.

Porque, né? 1) A pessoa morreu, se a outra tá sofrendo é porque ela não queria que aquela que se foi tenha ido. Não importa que o outro lugar seja melhor, ela queria que ela estivesse ali, ao lado dela, ponto. Com o tempo ela vai se conformar, mas ali, naquele momento, ela só iria querer um abraço da que morreu, como não dá pra fazer isso ou o pânico se instalaria, vão lá e abracem vocês.

2) Fazer a que tá sofrendo pela perda dela sofrer também pela perda da que morreu é cruel. A pessoa tá naquele momento super egoísta e doído, pensando que vai ficar sozinha no mundo, que nunca mais encontrará alguém tão legal e divertido pra substituir quem não tá mais ali e talz, aí vem o outro e pá, faz a pessoa entrar num processo de culpa sem fim: “poxa, é mesmo. Bem que ela me pediu pra ajudar a pintar as paredes na semana passada e eu disse que estava ocupada, mas era só porque eu achava a cor feia. Agora ela morreu sem realizar tudo que quis e a culpa é minha.”. Não, né?

3) A parte das jóias eu deixo porque vai ser divertido, né? Pra mim, claro. ;-)

2 comentários:

Caleidoscópio disse...

Muito bom Bea.
Difícil pensar sobre amorte e como tudo deve acontecer...Melhor seria viver de maneira diferente para encararmos esse momento de uma maneira diferente.
Para mim o mais importante é sempre deixar claro para quem eu amo que amo (td bem que isso implica transparência em relação a quem não me agrada tb, mas fazer o q!?).
Gostei do post.
=*

Nara disse...

ok, eu já sei que as joias vão ficar pra mim =) Aquele brinco da foto, inclusive.
Ah, se a mulher do Kill Bill consegiu sair sem canivete e lanterna, vc consegue, bea... Acredite em você!! =D